Frequentemente lemos e ouvimos discursos com a afirmação de que o Brasil detém uma das energias elétricas mais caras do mundo. É parte de nossa cultura de auto depreciação. Segundo a ONU, são 193 países e para tal afirmação teríamos que ter um amplo conhecimento das estruturas tarifárias de todos estes países. Com certeza podemos afirmar que o custo da energia do Brasil não está nem entre os maiores baseado em dados concreto de um conjunto expressivo de países e em exemplos práticos de contas obtidas por amigos que moram no exterior.
Tecnicamente possuímos um sistema elétrico de dimensões continentais com 173 GW de capacidade de geração (85,4% renováveis), 150 mil quilômetros de linhas de transmissão de altas tensões (Rede Básica ≥ 230 kV), uma capacidade de transformação instalada de 340 GVA, para uma demanda máxima horária de 84,8 GWh/h, em março/2021. Este é o cenário do sistema interligado nacional – SIN, operado e administrado pelo ONS.
A participação de energias renováveis na matriz elétrica brasileira foi de 84,8% em 2020 e, em 2019, foi de 27% nos 35 países membros da OCDE, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Nossa energia elétrica sim é uma das mais limpas do mundo. (BEN/EPE 2021).
Com esta simples analise de contar residenciais reais podemos observar que subtraindo-se os impostos nossa tarifa não difere das demais. Entretanto, ao analisarmos os impostos é que a distorção se evidencia. Façamos uma implosão do que está contido em nossas tarifas de energia, considerando as receitas anuais das distribuidoras estabelecidas pela ANEEL para o ciclo tarifário 2021/2022 sem os impostos ICMS, PIS e COFINS.
- Energia – 42,1%
- Parcela B (Custos Gerenciáveis pelas Distribuidoras) – 31,2%
- Encargos Setoriais – 16,2%
- Transporte – 10,5%
Dentro do custo da energia estão embutidos 2,8% relativos às perdas não técnicas (comerciais) e 11,8% devidos a CDE – Conta de Desenvolvimento Energético que custeia políticas públicas tais como descontos tarifários para baixa renda, irrigantes, rural, serviços públicos de água, esgoto e saneamento, etc. Para 2022 o valor orçado pela ANEEL foi de R$ 30,7 bilhões contra R$ 23,9 bilhões em 2021.
Subsídios cruzados internos às tarifas de energia elétrica dificultam qualquer avaliação comparativa com outros países no mundo e geram distorções nos preços da cadeia de produção brasileira. Benefícios sociais, perfeitamente válidos, devem ser suportados pelo contribuinte e não pelo consumidor de energia. Só por este detalhe as tarifas já poderiam ser cerca de 85% do custo que é hoje.
O maior custo da tarifa é a despesa com a compra de energia. O valor médio das compras deste período tarifário 2021/2022 é de R$ 227,48/MWh variando entre R$ 169,80 e R$ 306,25 por MWh. Representa uma variação de 60% em relação ao valor médio. Grande disparidade nos preços da energia entre as distribuidoras.
Devido a esta variação entre os preços de compra da energia, por meio dos leilões, as tarifas residenciais (B1) variam entre R$ 517,08 e R$ 803,72 por MWh. Uma variação de 46,1% em relação a tarifa média nacional de R$ 621,30 por MWh.
Esta assimetria tarifária nacional está diretamente ligada ao preço de compra da energia. As diferenças entre os preços inseridos nas tarifas e os efetivamente pagos poderiam ser melhor gerenciadas por um centro de custos único abastecido pelas distribuidoras, pelo valor considerado em suas tarifas, e pelo mecanismo das bandeiras tarifarias.
Existe espaço para melhorias no processo de compra de energia. Enquanto o preço médio no mercado regulado é R$ 227,48 no mercado livre oscila entre R$ 160 e R$ 170,00 por MWh. Ou seja, se paga cerca de 37% a mais no mercado cativo. Deixando de lado os contratos bilaterais, com prazo para extinção, as compras compulsórias de Itaipu e Angra, o restante deveria ter um comprador único que distribuiria de forma equalitária entre as distribuidoras reduzindo boa parte da assimetria tarifária.
Em relação aos impostos federais PIS, COFINS e estadual ICMS, em minha conta exemplo atingem um total de 41,8% sobre a tarifa residencial B1 regulada. Em média, para todos os grupos tarifários, representam 36,4% segundo a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica.
Em decisão de maio do ano passado, 2021, o Supremo Tribunal Federal retirou o ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS, porém não retirou da base do ICMS o PIS/COFINS. Pode fazer sentido do ponto de vista jurídico, mas jamais sob o ponto de vista de uniformidade de padrão.
Estes impostos incidem todos os componentes das tarifas, bandeiras tarifárias e sobre eles mesmo o que é incrível. Imposto sobre imposto. A receita de ICMS em 2021, em relação a energia elétrica, foi de R$ 65,9 bilhões (10,2% do total arrecadado pelos estados).
Concluímos que a nossa energia elétrica não figura entre as mais caras do mundo. O que temos é uma oportunidade de melhorar a estrutura tarifária com realocação de encargos sociais, mudança no processo de compra de energia e uma tributação mais justa.
Fonte: Diário do Poder.